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Argentina testa a paciência do Brasil e ameaça Mercosul

Fonte: Valor Econômico

 

O governo brasileiro estuda a adoção de barreiras não tarifárias para dificultar a entrada de produtos argentinos no mercado nacional. A ideia é incluir uma série de produtos no sistema de licenças não automáticas, tornando morosa ou mesmo inviável a liberação das mercadorias. As medidas, segundo antecipou ao Valor um ministro de Estado, deverão afetar as importações de automóveis, autopeças, alimentos e laticínios.

 

A Organização Mundial do Comércio (OMC) autoriza a aplicação de licenças não automáticas, desde que a liberação dos produtos não exceda o prazo de 60 dias e que a regra seja aplicada a todos os países. Quando recorre a esse tipo de mecanismo, um governo visa atingir, no entanto, não todas as nações de forma indiscriminada, mas um determinado país ou grupo de países. Com a licença não-automática, prevalece a discricionariedade no controle das importações.

 

O objetivo do Brasil é retaliar a Argentina, que, desde o fim do ano passado, vem aplicando licenças não automáticas a produtos de 37 segmentos das exportações brasileiras. A decisão de Buenos Aires vem dificultando a venda de calçados, produtos têxteis e móveis, além de itens da linha branca. As autoridades brasileiras alegam que, além de impor barreiras, os argentinos não estão respeitando o prazo limite de 60 dias das licenças não automáticas.

 

O que aborrece o governo brasileiro é a deslealdade do país vizinho no trato com seu maior parceiro comercial e aliado político. Há alguns meses, empresários brasileiros concordaram em reduzir voluntariamente as vendas para a Argentina de produtos de quatro setores: freios, embreagens, calçados e móveis. Os cortes são significativos e variam de 19% (calçados) a 40% (embreagens), na comparação com os embarques de 2008. Fabricantes de papel e bateria fecharam acordos semelhantes e outros setores estão em negociação, como o de têxteis e linha branca.

 

A preocupação de Brasília não é, nem poderia ser, com o fato de a balança comercial entre os dois países estar negativa para o Brasil – em US$ 48 milhões, até maio. O que chama a atenção são as artimanhas da Argentina, que está substituindo, de forma velada, produtos brasileiros por chineses e de outros países asiáticos. Dados recentemente compilados pela empresa de consultoria Abeceb mostram que as importações argentinas da China diminuíram 25% no primeiro trimestre de 2009. A queda foi bem maior, porém, no caso dos produtos exportados pelo Brasil (de 45%), forte indício de que o país vizinho está aplicando licenças não automáticas para mercadorias brasileiras.

 

O desvio de comércio em favor da China já vinha ocorrendo, segundo a Abeceb, antes mesmo da crise econômica. No período entre 2007 e 2008, enquanto as importações provenientes do Brasil para a Argentina cresceram 23%, as compras da China aumentaram 38%. Setores da indústria nacional como os de brinquedos, calçados, confecções e materiais de transporte foram especialmente atingidos.

 

O que se diz em Brasília é que o tratamento especial que os argentinos estão dando aos chineses decorre do fato de Pequim ter aberto uma linha de crédito de 70 bilhões de yuans, equivalentes a US$ 10 bilhões, para ajudar Buenos Aires. Trata-se de uma operação de swap cambial (troca de moedas) que permite ao país vizinho importar produtos da China sem usar dólares das reservas cambiais. O Brasil fez operação idêntica, mas de valor bem menor (US$ 5 bilhões).

 

O governo Lula tem sido leniente na relação com a Argentina. No Ministério das Relações Exteriores e mesmo no Palácio do Planalto, prevalece a ideia de que "a Argentina é um problema nosso", segundo as palavras de um ministro. Recentemente, a área técnica do governo propôs medidas duras contra o país vizinho, mas o Itamaraty impediu que isso acontecesse, alegando que uma retaliação neste momento prejudicaria a oligarquia Kirchner nas eleições legislativas.

 

Passadas as eleições, a disposição neste momento é aplicar as medidas para, pelo menos, obrigar os argentinos a se sentarem à mesa para conversar. Nas palavras de um ministro brasileiro, esta é a única linguagem que a Casa Rosada entende.


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