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Uma industrialização pautada pela tecnologia

Fonte: Janaína Ávila/Revista Mercado em Foco – ACIL 

Ironia do destino, mas parece que a crise provocada pelo novo coronavírus pode, finalmente, contaminar Londrina com um discurso interessante sobre industrialização. A cidade, já famosa como prestadora de serviços, começa a vislumbrar um futuro industrial, inspirado pelos desafios e oportunidades criados por outro panorama interessante: o da tecnologia.

Estudos já apontam tendências no mercado global e que, certamente, veremos reproduzidos na escala local. Embora as análises indiquem um caminho conturbado, vale a pena o exercício de imaginar um cenário não tanto catastrófico. Dessa vez, a indústria voltada para a tecnologia poderia colocar Londrina na frente de outras realidades, mais engessadas em processos e com modelos ultrapassados.

Para o gerente de assuntos estratégicos da Fiep (Federação das Indústrias do Estado do Paraná), João Arthur Mohr, a conjectura atual abre novas perspectivas para a indústria brasileira e paranaense, a partir da combinação de três fatores essenciais: uma produção localizada, proximidade ao consumidor e a tecnologia que encurta e traz inovação.

“Com a globalização, boa parte da produção foi deslocada para o sudeste asiático, seduzida pelos baixos custos de produção e mão de obra barata. A pandemia revelou que existem produtos que deveriam ser considerados estratégicos, com uma produção nacional para suprir o mercado em casos de necessidade, não só como aconteceu com essa emergência provocada pelo coronavírus, mas também em uma situação de bloqueio comercial ou guerra. Isso para não ficarmos dependentes de um país, como o que aconteceu com os EPIs (Equipamentos de Proteção Individual usado pelos profissionais de saúde), todos produzidos na China. A importação ficou inviabilizada pelo bloqueio dos aeroportos, faltou matéria-prima”, conta.

O raciocínio é lógico. É muito mais interessante ter uma indústria brasileira que também fabrica determinado produto e, diante de uma situação extrema, pode duplicar turnos, triplicar a produção e atender a demanda local. “O industrial pode fazer uma análise de quais são esses produtos que precisam recuperar lugar na produção nacional seguindo essa ‘desglobalização’ e encarar a oportunidade de bons negócios”, ressalta.

Na avaliação do gerente da Fiep, as novas relações de consumo também apontam uma direção interessante para a indústria que pode investir no e-commerce, exatamente como já faz o varejo, criando assim um canal direto com o consumidor final, e com algumas vantagens, como oferecer uma customização ‘de fábrica’. Para Mohr, é uma nova forma de interagir com o mercado. “Com o trabalho acontecendo em home office, as indústrias moveleiras – fortes na região – podem passar a oferecer móveis sob medida, que encaixam no mobiliário já existente. Todos vão precisar criar um ambiente de trabalho dentro de casa. Outra oportunidade para a indústria de se reinventar”, pontua.

A vocação tecnológica de Londrina também se apresenta como uma excelente chance para repensar um processo de industrialização. “Temos um grande hub de tecnologia de informação já instalado, é uma cidade tecnológica. Esse mercado tem tudo para se expandir vertiginosamente, uma oportunidade fantástica para empresas de tecnologia de informação e inteligência artificial. Estamos falando de softwares, ferramentas tecnológicas, tudo para a digitalização dos processos de produção com um futuro muito promissor”, analisa. “Esse é o grande momento para as empresas que apostam em inovação tecnológica”, completa Mohr.

Para ele, a situação atual expõe uma das características do empresário, a de enxergar a oportunidade em um momento de crise. “É observar as novas características do mercado e perceber as novas exigências. Alguns setores vão perder terreno, mas outros vão ganhar e a indústria tem tudo para se reinventar”, afirma. Para o especialista, uma indústria que consegue agregar valor ao seu produto só tem a ganhar no atual cenário, e talvez esse seja um dos motivos para o setor agroindustrial sair ainda mais fortalecido da crise.

Sobrevivência

Para o presidente da ACIL, Fernando Moraes, o grande desafio agora é sobreviver ao período difícil, na esperança da economia retomar o crescimento. Para a indústria londrinense, a dificuldade se apresenta ainda maior, já que grande parte da produção não é voltada ao abastecimento do mercado local. “A maior parte dos clientes da nossa indústria fica em São Paulo e no Nordeste, e ficou tudo fechado. Com a volta do comércio, aos poucos, a indústria retoma a produção, mas já sabemos que será muito lentamente”, diz.

Ainda assim, Moraes vê no comportamento do consumidor um bom indicativo para adaptações na produção. “Percebemos o aumento na procura de itens para melhorar o conforto das casas, já que é ali que estamos passando a maior parte do tempo. Com a necessidade de trabalhar em casa, a procura por eletrônicos disparou. Fazia tempo que não se vendia tantos notebooks como agora, por exemplo. São segmentos que vão na contramão da crise”, afirma.

Mas tudo isso não basta para espantar as nuvens escuras do horizonte. “A população mundial vai ficar mais pobre, muitos vão perder os empregos, a inadimplência vai aumentar e isso tudo afeta a indústria. Pode ser urgente repensar o modelo de industrialização que queremos para Londrina. Com esse choque, é preciso nos modernizar, e o nosso empresariado está atento a isso”, analisa.

Para Moraes, a tecnologia que já faz parte do DNA de Londrina pode oferecer uma grande oportunidade de crescimento econômico. Mas, para isso, também é preciso linhas de crédito que garantam um novo fôlego ao setor. “Uma das nossas batalhas, além da necessidade urgente de desburocratização na instalação de novas empresas, é uma lei que garanta um incentivo fiscal, como a lei 15.634/2007, apelidada de Lei Zucchi”.

A lei garante um tratamento diferenciado em relação ao ICMS de produtos eletroeletrônicos, telecomunicações e informática, além do desenvolvimento de software. Já é aplicada em cidades como Foz do Iguaçu e Pato Branco, mas ainda não é uma lei estadual. “Sem isso, acontece que as startups de Londrina, quando começam a amadurecer, precisam ir atrás de um outro município que ofereça mais incentivos e benefícios”, continua. Para o presidente da ACIL, a tecnologia tem tudo para oferecer à cidade um parque industrial moderno, limpo, gerando empregos e não poluição.

Marcus Gimenes, diretor industrial da ACIL e presidente do Sindimetal Norte PR, também coloca a burocracia como um impedimento para a atração e instalação de novas indústrias na Cidade.

Além disso, reconhece o surgimento de novas oportunidades para a indústria nesse período, mas a preocupação com aquelas que chegaram até aqui fragilizadas é maior. “O setor industrial vem perdendo participação no PIB no mundo todo. As empresas estão diminuindo de tamanho e estamos assistindo a uma quebradeira, o desemprego tende a aumentar e a retração na economia é inevitável”, diz.

Com a calculadora nas mãos, o empresário projeta uma queda no faturamento do setor industrial alarmante e, com isso, uma taxa de desemprego ainda mais desesperadora. “Nesse momento, bem ou mal, as pessoas estão consumindo, mas isso vai diminuir. É impressionante como a nossa economia depende de crédito! Assistimos a um esforço do Governo em oferecer linhas de crédito e de fazer o dinheiro circular; isso muito dificilmente terá um reflexo positivo no PIB. Traz apenas um alento e um fôlego”, analisa.

Para Gimenes, pode acontecer que a percepção da crise no setor industrial na nossa região seja diferente, graças ao papel importante do setor agroindustrial. “Pena que a indústria não tenha os privilégios que a agricultura tem, somos o setor mais tributado, chega a 30% em alguns casos”, diz. “É preciso uma boa estratégia de sobrevivência até que a economia volte a crescer. As empresas têm que fazer o dever de casa: reduzir custos, buscar novos mercados, rever a produção, aproveitar o câmbio e exportar, identificar alternativas de negócios e complementos para o faturamento. Além disso, cobrar do Governo o dever pra fora de casa: uma redução no custo de logística, dos tributos, a desoneração da folha de pagamento entre outras coisas. O empresário tem que se reinventar no meio de uma confusão política. Um cenário que poderia ajudar, mas só atrapalha”, completa Gimenes.


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