Fonte: Lucas Marcondes – Revista Mercado em Foco
Londrina
tem em seu DNA o gene da (re)invenção. Antes celeiro mundial do
café, a cidade buscou novos caminhos após a fatídica geada negra
de 1975. Os campos que outrora abrigaram o “ouro verde” foram
substituídos principalmente pela soja. O município que era apenas
um ponto cinza em meio ao sertão do norte do Paraná deu um salto
para se tornar referência regional e nacional no setor de serviços.
Hoje, Londrina mantém a chama inventiva acesa. E as possibilidades
são cada vez mais amplas. Um bom exemplo vem da Agência de Inovação
Tecnológica da Universidade Estadual de Londrina (Aintec-UEL).
Apenas em 2014, a Aintec depositou 23 pedidos de patentes de produtos
no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). O número
superou todas as marcas de anos anteriores.
Entre
os atuais inventores pés-vermelhos está a professora Maria Antonia
Celligoi, do Departamento de Bioquímica da UEL. Ela e sua equipe
desenvolveram em laboratório dois tipos de açúcar obtidos a partir
de microorganismos encontrados no alimento japonês natô, que nada
mais é do que uma mistura de grãos fermentados de soja. O produto
já foi aplicado em barras de cereal em substituição ao açúcar
comum e o público aprovou: 89 de 100 estudantes da própria
universidade que consumiram o alimento o classificaram como “muito
bom”. Além disso, está em fase de desenvolvimento um achocolatado
feito com base no produto. “É fácil de produzir e tem várias
aplicações. Existem pesquisas que mostram que o produto reduz o
colesterol, a glicemia e diminui a inflamação de células
cancerígenas”, detalha a pesquisadora.
Invenções
naturais
Ainda na UEL, mas no Departamento
de Microbiologia, outros dois grupos de docentes e estudantes compõem
o rol das patentes requisitadas via Aintec durante o ano passado. Os
professores Gerson Nakazato e Renata Kobayashi desenvolvem produtos
antimicrobianos naturais, como óleos essenciais. Apenas em 2014, a
equipe da qual eles fazem parte foi responsável por quatro dos 23
pedidos de patentes feitos através da Agência de Inovação
Tecnológica. “Parcerias são extremamente importantes no
desenvolvimento dessas pesquisas. Um exemplo é o Departamento de
Biologia Animal e Vegetal, que tem um professor que trabalha com
determinada espécie de abelha cujo mel pode ser usado em nossos
produtos porque possui atividade antimicrobiana”, conta Nakazato. O
grupo do professor Galdino Andrade Filho, também da Microbiologia,
requisitou a patente de um biofertilizante natural. “É um fungo
que se associa às raízes do vegetal e transfere fósforo do solo
para a planta. Em alguns casos, como o do algodão, o produto pode
substituir a adubação a base de fosfato”, explica.
Mas
ainda é longo o caminho até que a patente de uma invenção se
torne um produto a ser consumido no mercado. “A nossa legislação
é bem morosa em relação a outros países. Leva-se, em média, oito
anos, para ter toda a proteção em cima da patente. Nesse período,
dependendo da tecnologia, ela pode estar ultrapassada”, critica o
diretor da Aintec, Edson Miura. O professor Galdino Andrade Filho
compartilha da mesma opinião. “Eu depositei uma patente em 2008 e,
até hoje, o processo não foi finalizado. Eu conheço pesquisador
que espera há 15 anos. Na Coreia do Sul você tem uma patente em
dois anos. Na Argentina são três anos.”
Além
disso, os pesquisadores entendem que a academia e o mercado ainda
possuem diferentes maneiras para estreitar parcerias. Para a
professora Maria Antonia Celligoi, trata-se de uma via de mão dupla,
em que os empresários também têm de dizer quais são as carências
do consumidor de seus produtos. “Não posso só querer que o
mercado me acolha. A indústria e o comércio têm de trazer para nós
as suas necessidades. Estamos desenvolvendo coisas que as empresas
podem vir conhecer”, diz a pesquisadora, comentando também que a
universidade se encontra mais aberta a este tipo de iniciativa.
“Quando eu entrei na UEL, em 1987, não se falava em patentes. A
prestação deste tipo de serviço era proibida. Mas a universidade
evoluiu nesse sentido. Falta muito, mas melhorou”.
Os
professores Gerson Nakazato e Renata Kobayashi afirmam que o
laboratório onde trabalham possui totais condições de atender
empreendedores da região. “A universidade e a indústria podem se
aproximar mais. Se uma empresa quer pesquisar um novo produto – um
cosmético, por exemplo – nós podemos testá-lo aqui e auxiliar no
desenvolvimento da ideia. Aqui nós temos toda a infraestrutura”,
garante Renata. E, segundo os pesquisadores, apenas o campo onde
trabalham pode atender diferentes segmentos da economia. “Precisamos
de parceiros para colocar no mercado os produtos que podem ser
utilizados em áreas como a farmacêutica, veterinária e de
odontologia. O empresário pode comprar minha patente até mesmo
antes de ela ser registrada”, explica Nakazato.
Futuro
promissor
Fabrício Bianchi, consultor do
Sebrae-PR, avalia que Londrina vive uma nova página de sua história
quando o assunto é inovação. Contudo, de acordo com ele, a cidade
ainda tem de encarar desafios que atingem todo o País. “Um grande
gargalo que existe em nível de Brasil é fazer um link
nessa tríplice que envolve quem precisa, quem produz e quem pesquisa
tecnologia. É preciso criar a cultura da troca para que as pessoas
se conheçam”. Ao mesmo tempo, o consultor destaca boas ideias
voltadas à inovação. Entre elas, os R$ 10 milhões
disponibilizados apenas neste ano pelo programa Sebraetec e a lei de
inovação de Londrina, projeto que, por enquanto, se encontra em
gestação graças a uma parceria entre entidades públicas e
privadas, mas promete um grande avanço para o tema na cidade.
E,
no universo acadêmico, apesar dos percalços já listados, há quem
acredite que é possível que universidade e mercado caminhem juntos.
Caso do Núcleo de Empresas Juniores (NEJ) da UEL, que reúne 14
negócios de ramos como farmácia, psicologia e ciência da
computação criados por estudantes. “A inovação é um dos nossos
diferenciais. Como ainda não somos profissionais, precisamos dela
para sair na frente. Há empresas juniores que estão com lista de
espera de clientes desde o ano passado. É muito comum empresas
contratarem mais de um de nossos serviços”, relata a presidente do
NEJ, Amália Clivati. Seja em iniciativas como a dos universitários
empreendedores, ou por meio de invenções que prometem ser
revolucionárias, as sementes da inovação já foram lançadas.
Dessa vez não são de café, mas têm o mesmo potencial de, mais uma
vez, revelar Londrina para o mundo.