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Acordo Mercosul-União Europeia reconfigura comércio global

Fonte: Francismar Lemes – Revista Mercado em Foco/ACIL

Novos fluxos de comércio em que a economia política encontra na mesa de negociações retóricas, cada vez mais ideológicas, tensionam mudanças no jogo de interesses mundiais. Uma dessas peças foi mexida com o acordo comercial entre o Mercado Comum do Sul (Mercosul) e a União Europeia (UE). É uma reviravolta às ambições protecionistas de alguns líderes, que obrigará players, a exemplo do Brasil, a não contar apenas com uma carta – as commodities – elevando suas apostas na eficiência e competitividade.

O futuro do acordo costurado por 20 anos de negociações, envolve uma população de 260 milhões de habitantes da aliança regional Paraguai, Uruguai, Argentina e Brasil. Os dois últimos países são duas economias combalidas e têm razões para esperar muito do livre comércio. O que dizer para essa população, principalmente, a brasileira, que espera a retomada da economia e do emprego?

Qualquer resposta assertiva virá a longo prazo, depois que o acordo for ratificado por 28 parlamentos na Europa e quatro na América do Sul. O processo deve levar dois anos. Analistas se desdobram para decifrar esse futuro.

Quando o pacto estiver totalmente implantado, vai retirar tarifas sobre 91% dos produtos que a UE exporta para o Mercosul num período de 10 anos. Em sinal invertido serão retiradas tarifações de 92% dos produtos da aliança regional sul-americana por uma década. São algumas regras do jogo, mas muitos pontos ainda não estão claros.

Para Alexandre Farina, CEO da Agência de Desenvolvimento Terra Roxa, uma Oscip (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público), criada com o objetivo de divulgar os potenciais econômicos e buscar investidores para as regiões Norte e Noroeste do Paraná, a negociação é importante econômica e culturalmente.

"O acordo aponta novos passos para o Brasil com impactos no dia a dia das empresas. Numa visão macro integrará o país às cadeias globais de valor. O que vai impactar a indústria porque a cadeia global de valor leva em conta que, o produto final, tem os seus insumos com origem em diversos países, conforme a competitividade de cada um. O Brasil passou pela verticalização das suas cadeias industriais. Isso tende a ser repensado, a partir de um acordo dessa magnitude", avalia Farina.

Este é um momento de atenção para o Brasil, que tem assistido ao derretimento dos empregos, mas que, com um custo de produção menor que a UE, poderá atrair investimentos.

“São necessários uma mentalidade e adesão das empresas e do país à abertura comercial e capacidade para absorverem essa nova cultura. Na hora de planejarem o desenvolvimento das empresas, precisam levar em conta que o Brasil não está mais isolado e que isso pode impactar, inclusive nos empregos”, analisa o CEO.

Mais eficiência e menos burocracia

A série histórica da Terra Roxa, desde a fundação em 2004, demostra o potencial de negócios com o bloco europeu, apesar das preocupações com as concessões, que incluem a redução de tarifas sobre carros importados e peças automotivas, bem como a abertura do nosso mercado de licitações públicas.

Farina ressalta que a agência, em parceria com a ACIL e a Federação das Indústrias do Paraná (FIEP), recebeu mais de 150 delegações internacionais no norte paranaense para promover negócios. A maioria dos relacionamentos foi com países da UE. O CEO afirma que as barreiras não são culturais, que representam um facilitador pela origem da colonização da região. Os entraves aparecem nas tarifas, câmbio e burocracia, que podem ser quebrados pelo pacto.

O Mercosul conquistou eficiência no agronegócio, principalmente, a Argentina e o Brasil, na produção e exportação de carnes bovinas, suínas e de aves, para Europa.

O economista Marcos Rambalducci, consultor econômico da ACIL e professor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), afirma que o Brasil precisa fazer mais se quiser ser competitivo na UE.

“O setor privado precisa aumentar a produtividade, reduzir custos, é o que chamamos de mais eficiência para dentro da porteira, tanto na produção agrícola, como industrial”, avisa. “O governo tem um papel preponderante. Primeiro, facilitar a redução de impostos e taxas, e investir na infraestrutura e logística para que não se produza barato no campo ou na indústria e tenha perdas na estrada. Precisamos ter um sistema modal e de portos mais eficientes. Lembrando ainda que estamos entrando para um mercado de 800 milhões de consumidores, 25% da economia mundial”, avalia Rambalducci.

O economista também defende um drawback azeitado. O regime aduaneiro especial permite que empresas exportem produtos e importem insumos para fabricá-los, podendo obter a isenção ou suspensão de tributos relacionados às matérias-primas importadas.

Com isso, o Brasil poderá aumentar a sua eficiência com a importação de tecnologia mais barata, aumentando a competividade.

A diretora de Comércio Internacional da ACIL e CEO Tepcomex, Karina Turbay Schnaid, ressalta que, hoje, para mercado exterior, a eficiência está implícita nas negociações.

“Independente do acordo, as empresas devem se preparar para o mercado internacional. O momento está mais do que propício para o Brasil se destacar em todas as áreas da economia. Temos como objetivo instruir, desenvolver e buscar novos mercados para os empresários. Dar todo esse suporte, que irá além de capacitação, para darmos esse passo a mais”, considera Karina.

Organizar as cadeias produtivas

O empresário paranaense precisa se organizar e aprimorar os processos de gestão para aumentar a eficiência e produtividade, uma opinião praticamente consensual no sistema produtivo.

O vice-presidente do Sindicato das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações, Pesquisas e de Serviços Contábeis de Londrina e Região (Sescap-Londrina), Euclides Nandes Correia, afirma que é preciso fortalecer e organizar as cadeias produtivas.

Um exemplo dessa necessidade é o agronegócio que, apesar de estar sustentando o Produto Interno Bruto (PIB), durante a crise, ainda precisa de organização.

Correia cita a exigência de livro-caixa digital para produtores que faturam mais de R$3,6 milhões, como uma inovação. Embora não tenha essa finalidade, contribui para essa organização e melhor gestão dos negócios.

“Quando o fisco volta os olhos para um determinado segmento obriga esses setores a se organizarem. É um ponto positivo não só para obrigar, mas estimular a organização. Trazendo esse exemplo para outros setores, como o empresarial, o empresário terá que controlar melhor os seus custos, administrar melhor os resultados do seu negócio. É preciso investir em controles nas empresas para que possamos ser mais competitivos. Não dá para ser amador”, afirma Correia.

Outro exemplo é citado pelo economista Marcos Rambalducci. Ele destaca que a indústria moveleira da região, especificamente de Arapongas, que exporta para o Mercosul, África e América Central, precisa conhecer o mercado europeu, o consumo e as exigências desse consumidor, que são diferentes do que o nosso parque moveleiro está apto a produzir. Haverá espaço para a instalação de novas empresas com radar apontado para as necessidades de consumo da UE.

A maioria dos analistas entrevistados concorda que o governo federal não poderá colocar na mesa de negociações, sempre que quiser, retóricas ideológicas.

A melhor hipótese é que estamos no ponto de partida do jogo em que todos querem ganhar. Rambalducci e outros analistas fazem apostas:

“O Brasil é um país para ser investido. Os países europeus são maduros. Quando o crescimento atinge 1,5% é motivo de comemoração porque a população europeia não cresce. Há consumo daqueles indivíduos sem crescimento da população. Nós, por aqui, ainda temos um potencial enorme de consumo. Cada cidadão nosso pode consumir três vezes mais do que os europeus. Temos condições para crescer 3% ao ano, o que é impensável para os países europeus. É por isso que a Europa se interessou pelo acordo”, conclui Rambalducci.


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