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Emendas ‘importadas’ para Londrina estão sob investigação do MPF

Fonte: Jornal de Londrina

Mil quilômetros separam o Rio de Janeiro de Londrina, distância que não impediu dois ex-deputados federais fluminenses de destinar R$ 18,5 milhões em emendas ao orçamento da União de 2011 para a cidade. Na versão oficial, a indicação nasceu apenas da camaradagem entre o atual prefeito Barbosa Neto (PDT) e os ex-parlamentares Leo Vivas (PRB) e Vinícius Carvalho (PTdoB). O acordo em torno da “importação” dos recursos, porém, envolve suspeita de pagamento de propina de R$ 925 mil e está sob investigação do Ministério Público Federal (MPF).

Vivas e Carvalho, que não tentaram se reeleger no ano passado e estão sem mandato, foram os únicos congressistas de fora do Paraná a sugerir emendas individuais para o Estado nos últimos quatro anos. O valor pedido por eles é quatro vezes superior ao total de emendas propostas por sete deputados paranaenses no mesmo período (2008-2011) para outros estados, conforme levantamento publicado ontem pela Gazeta do Povo e pelo JL.

Do total de R$ 13 milhões a que cada um dos dois fluminenses tinha direito de sugerir ao orçamento de 2011, Vivas alocou 96% (R$ 12,5 milhões) para Londrina e Carvalho 46% (R$ 6 milhões). A verba foi destinada para a saúde e para o recapeamento de ruas.

De acordo com a assessoria de imprensa da prefeitura, a negociação sobre as emendas foi feita entre Barbosa Neto e Carvalho. A relação entre os dois teria surgido quando eles trabalharam juntos na Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara. Antes de assumir a prefeitura, em 2009, Barbosa também era deputado federal.

A informação sobre a “amizade” entre Barbosa Neto e Carvalho foi confirmada por Vivas. Ele disse que, em princípio, não faria qualquer emenda individual no ano passado. Acabou sendo convencido por Carvalho a prestar “um favor” para um amigo (Barbosa Neto) que precisava de “ajuda”. Pelas regras de elaboração do orçamento da União, não há qualquer impedimento ou ilegalidade no fato de o representante de um Estado alocar recursos de emendas para outro. O ex-deputado disse ainda que não aposta na liberação de recursos. “Não acredito que saia nada.”

Um mandato

Os dois ex-deputados fluminenses exerceram apenas um mandato na Câmara (2007-2011) e não moram mais no Rio. Leo Vivas e Vinícius Carvalho são ligados à Igreja Universal do Reino de Deus. O primeiro foi bispo e o outro é pastor.


Vivas disse que não concorreu à reeleição e que se mudou para Brasília para cumprir “um projeto estabelecido pelo partido [o PRB]”. Carvalho hoje mora em Belo Horizonte. Embora tenha sido eleito pelo PTdoB, hoje é do PRB, partido ligado à Universal. “Havia um descontentamento muito grande com o trabalho dele [Carvalho] como deputado”, disse o presidente do PTdoB no Rio de Janeiro, Vinícius Cordeiro. Das 25 emendas apresentadas por Carvalho ao orçamento de 2011, apenas uma era para o Rio, no valor de R$ 150 mil.

A reportagem entrou em contato com a assessoria nacional do PRB para localizar e entrevistar Carvalho, mas ele não foi encontrado. Também deixou recado em um número de telefone que, segundo a assessoria, seria do ex-deputado e em duas contas de e-mail, mas não obteve resposta.


Pagamento em duas vezes

Na contramão da versão de que a destinação das emendas dos ex-deputados do Rio de Janeiro para Londrina tenha ocorrido devido ao coleguismo com o prefeito Barbosa Neto, o Ministério Público Federal (MPF) investiga a denúncia de havia na verdade um esquema de pagamento de propina para a obtenção dos recursos federais.

O ex-chefe de gabinete do prefeito, Fábio Góes, foi denunciado por ter supostamente recolhido dinheiro com empresários de Londrina para pagar propina para pelo menos um dos dois ex-deputados fluminenses (Leo Vivas), em troca das emendas. O caso chegou ao MPF após um depoimento prestado em maio pelo empresário Wilson Vieira ao Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco).

Na prática, a apuração do MPF é um desdobramento da Operação Antissepsia, desencadeada pelo Ministério Público Estadual, na qual o Gaeco tratou de desvios na área de saúde em Londrina. No depoimento, Vieira afirma que teriam sido repassados R$ 925 mil, em duas vezes, a um homem conhecido como JB, que seria assessor parlamentar de Vivas.

Os repasses, segundo o depoimento do empresário, foram feitos em duas ocasiões, em dois hotéis diferentes de Londrina, em dezembro do ano passado. As emendas foram apresentadas ao orçamento em 25 de novembro.

Vieira diz ter acompanhado Góes em uma das entregas e que, numa segunda vez, repassou dinheiro sozinho, atendendo a orientação do ex-chefe de gabinete. O empresário também diz ter dado um cheque de R$ 70 mil, em nome da sua empresa. Quanto à entrega do dinheiro, Vieira narra que a fez a “um homem que se identificou como JB e apresentou-se como assessor de deputado”. A segunda entrega aconteceu cerca de dez dias depois da primeira.

Depois disso, Vieira prestou um novo depoimento, dessa vez ao MPF, e confirmou apenas parte do que havia dito ao Gaeco. Afirmou que foi procurado por Góes no começo de dezembro e que o ex-chefe de gabinete de Barbosa Neto pediu um cheque de R$ 40 mil. O cheque da sua empresa foi depositado na conta de Bruno Valverde, da ONG Instituto Atlântico, mas voltou por falta de fundos. Valverde, por sua vez, teria repassado R$ 20 mil em dinheiro para Góes.

Segundo Vieira, Góes afirmou que o dinheiro “estava sendo angariado junto a empresários de Londrina” e seria “dado em garantia de um empréstimo para fins de cobrir despesas de hospedagem e outras, como transporte e alimentação para a assessoria de parlamentar que estava em Londrina [a assessoria] para viabilizar emendas ao orçamento da União”.

Prefeitura desistiu das emendas

A prefeitura de Londrina informou, por meio de nota, que desistiu de tentar a liberação das emendas dos dois ex-deputados fluminenses junto ao governo federal. O texto diz que o motivo teriam sido as contrapartidas exigidas na elaboração dos convênios com a União. Para receber os R$ 18,5 milhões, o município precisaria investir 8% desse valor (R$ 1,48 milhão). Procurado pela reportagem, o prefeito Barbosa Neto preferiu não conceder entrevista.

O advogado João dos Santos Gomes Filho, contratado por Barbosa, disse que Vieira “deixou muito patente que o prefeito não tem nada a ver com isso [o suposto pagamento de propina aos ex-deputados] Se existe investigação e essa investigação aponta uma ilicitude tópica em desfavor de deputados, isso não quer dizer o prefeito”, declarou Gomes Filho. O ex-chefe de gabinete, Fábio Góes, não foi localizado. O mesmo aconteceu com o empresário Wilson Vieira e os dois advogados que o acompanharam nos depoimentos ao Gaeco e ao MPF, Ana Paula Delgado de Souza Barroso e Jéferson do Carmo Assis.


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