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Quando lucrar é só uma entre tantas finalidades

Por Danilo Marconi – Revista Mercado em Foco – ACIL

Por trás dos vidros espelhados de um imponente prédio comercial na Avenida Higienópolis, o empresário Luiz Meneghel Neto tenta avistar no horizonte a SL Alimentos. Não consegue. Fisicamente, a indústria está a mais de 80 quilômetros de distância. Mas sabe que está tudo bem em Mauá da Serra, afinal a colheita de aveia acabou e a produção armazenada nos moinhos da fábrica garante o pleno processamento dos grãos. Do escritório, ele acompanha os números do mercado, os pedidos de venda, a distribuição. E haja negócio.

A SL Alimentos é considerada a maior processadora de aveia do Brasil. A indústria é a fornecedora de multinacionais líderes de mercado. Completou 30 anos de fundação, conseguiu alcançar esse patamar com a adoção de uma política que vem transformando a administração, o valor compartilhado.

“O valor compartilhado é uma nova abordagem da gestão administrativa que vai além do trade off, que é a troca de capital pelo produto. Ele transforma o propósito da empresa, não visa o lucro por si só, mas viabiliza uma onda de criação e produtividade que pode impactar na economia local como um todo. É uma nova relação entre a indústria com a sociedade – a empresa aprende a gerar valor dos seus produtos e serviços transformando o todo”, define a pesquisadora e coordenadora do curso de Administração da PUC Londrina, Adriana Martello Valero.

Primeiro, a SL trabalhou na formação e firmou parcerias com os agricultores da região para garantir o abastecimento de matéria- prima, processo que ao longo dos anos colocou o Paraná no posto de principal produtor de aveia do Brasil. Paralelamente, por meio de acordos com institutos de pesquisa, a empresa ajudou a desenvolver variedades de sementes e, assim, conseguiu garantir a produção da indústria até numa eventualidade quebra da safra por problemas climáticos. Esse conjunto de ações garantiu um crescimento médio de 18% no volume de processamento de aveia sob a forma de flocos, flocos finos, farinha integral, aveia tostada e oat bran (farelo com maior concentração de fibra solúvel). “Temos que estar sempre pensando à frente e atentos ao que o consumidor está buscando”, ressalta Luiz Meneghel Neto.

E engana-se quem pensa que o trabalho parou por aí. Paralelamente, os sócios-proprietários viram a preocupação dos consumidores em adquirirem alimentos de ‘rótulos limpos’, também denominados de clean label. Acompanhando a tendência de mercado, a companhia implantou um programa de boas práticas ajudando no desenvolvimento de centenas de produtores locais. “Estabelecemos há cinco anos um programa de boas práticas agrícolas no qual levamos conceitos de controle de qualidade e segurança de alimentos da indústria para o campo. Ajudamos o agricultor a elaborar sua documentação técnica, a controlar a aplicação de pesticidas, o descarte de embalagens, o treinamento de pessoas”, explica o diretor industrial da SL Alimentos, Thomaz Setti.

E com o ritmo de crescimento do segmento de alimentos funcionais, entre 7 e 8% ao ano, a tendência é aumentar ainda mais o faturamento de toda a cadeia produtiva. A SL está investindo no desenvolvimento de baby food (que exige baixo resíduo de pesticida), alimentos orgânicos e gluten-free (obteve a certificação gluten-free recentemente). Todos esses programas exigem a rastreabilidade – o controle de toda a cadeia produtiva -, que mais uma vez conta com o relacionamento e o controle realizado com produtores rurais e parceiros. A indústria entra numa etapa de implantação de uma política de energia limpa com objetivo de ser autossuficiente neste quesito.

Falhas comuns

Alcançar esse nível de excelência não é fácil. Além de visão de negócio, a SL Alimentos investiu em pesquisa e muito em treinamento de pessoal. A especialista Regina Nakayama aponta que muitas empresas falham nessas etapas não compartilhando valor à marca. “Tenho percebido que a gestão que envolve marketing é muito cobrada por fazer essa comunicação do negócio para o mercado. Mas não é só isso, tem muitas empresas levando essa mensagem (de valor compartilhado) sem ao menos trabalhar esse conceito internamente (entre funcionários)”, pondera.

Na era da internet, esses problemas tendem a ficar ainda mais acentuados. “Como hoje o contato entre empresa e consumidor é cada vez mais frio, haja vista que muitos negócios ocorrem remotamente, tem que ter cuidado. O consumidor não escolhe um local só pela técnica da empresa, mas também pelo comportamento das pessoas que fazem parte daquela empresa. Por isso, a empresa tem a necessidade de mesclar o que tem de técnica, conhecimento e domínio do negócio em todos os níveis”, explica Regina.

Essência do negócio

E foi observando a falta de sintonia entre clientes e bancários, aliada às altas taxas cobradas no mercado, que um empresário do ramo de materiais de construção teve um insight de criar uma cooperativa de crédito. Assim nascia o Sicoob Norte. E por que uma cooperativa? “Porque dentre os princípios do cooperativos tem o interesse pela comunidade, o caráter social”, pontua o presidente do Sicoob Norte, Rafael de Giovani Netto.

Atuando há pouco mais de uma década, o Sicoob Norte integra uma rede de atendimento com mais de 4,2 milhões de pessoas, números que colocam a empresa na vanguarda do sistema financeiro cooperado do país. Na região de Londrina são mais de 32 mil associados diretos. Indiretamente, o número de pessoas atingidas pela cooperativa é muito maior.

Tudo porque o Sicoob Norte desenvolve pelo menos 25 ações sociais anualmente “que transformam vidas”, assim define a assistente social e Analista de Responsabilidade Social do Sicoob Norte, Angela Prates do Nascimento. Cursos profissionalizantes, desenvolvimento pessoal, educação financeira e/ou ambiental são apenas alguns dos exemplos.

O Cooper Jovem, um dos maiores desses projetos, ofereceu capacitação para 220 professores da rede de ensino. Cerca de seis mil crianças foram atendidas ano passado em Londrina e região. Outra atividade de destaque é o chamado Espaço Social, onde são oferecidos cursos profissionalizantes para moradores de comunidades carentes.

“A essência do Sicoob Norte sempre foi baseada em desenvolver economicamente e socialmente as comunidades com projetos que transformem vidas. Ao melhorar o ambiente da comunidade onde o Sicoob tem um ponto de atendimento, há uma troca produtiva nesse universo de valor compartilhado, gera renda e conhecimento. De alguma forma, haverá um retorno daquele investimento na sociedade”, explica Rafael de Giovani.

O valor da filosofia de trabalho

Quem entra numa loja própria da Hachimitsu, em Londrina, encontra um quadro recheado de fotos. São os ‘funcionários do mês’ e a quantidade não é à toa! Atendente, vendedor, auxiliar de produção e confeiteiros são colocados lado a lado, assim como os proprietários da empresa que adoça o paladar dos londrinenses há 13 anos. “É que aqui somos todos iguais”, explicou uma das atendentes.

Ao colocar todos num mesmo padrão hierárquico, distribuindo de forma igualitária as gratificações e expondo esses conceitos aos consumidores, mesmo que de forma singela e que pode passar despercebido pela maioria das pessoas que circulam pelas lojas, a empresa ganha ainda mais o respeito e admiração de clientes. “E essa comunicação é essencial para o negócio, agrega valor à marca, amplia valor ao produto”, afirma o gerente regional do Sebrae, Fabrício Bianchi. “As empresas que não enxergam essa mudança global, de respeito ao outro e ao meio, tendem a ser destruídas em breve. É muito importante comunicar e traduzir as ações da empresa para o público”, explica.

Na Hachimitsu, valor compartilhado está na ‘filosofia de trabalho’. “Trouxemos essa ideia da cultura oriental. O trabalho é de uma equipe, não de uma pessoa. Tem que dividir para multiplicar”, explica a empresária Suely Kato.

A empresa conta com 60 funcionários diretos. No fim do ano passado, o grupo compartilhou cafés especiais para comemorar as vendas de panetones. Além disso, a comissão das vendas também foi dividida e, melhor, os empregados ganharam uma viagem – com tudo pago – para Foz do Iguaçu. “A gente trabalha muito para isso, mas é um exercício diário. É uma energia e uma reafirmação diária da vontade de querer. Assim a gente segue caminhando.”.


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