Por Giovana Chiquim
De acordo com pesquisa da Robert Half, empresa de consultoria que atua na área de recrutamento, a rotatividade de pessoal aumentou em 82% nas companhias brasileiras nos últimos três anos. A média do turnover no mundo todo é de 38% – mais de duas vezes menor – o que demonstra que o Brasil ainda precisa avançar na área de gestão de pessoas. A pesquisa foi divulgada no ano passado e contabilizou 1.775 entrevistas com diretores de recursos humanos de 13 países, sendo 100 brasileiros.
O setor do varejo é um dos mais afetados pela rotatividade dos colaboradores. Para o diretor comercial da ACIL, Fernando Maurício Moraes, o motivo seria o perfil dos funcionários que atuam no setor: um público jovem, com menos de 30 anos. “Não conseguimos fidelizar esses colaboradores, que trocam constantemente de emprego por um acréscimo de R$ 100 reais no salário. Como a oferta de empregos é grande no varejo, eles se sentem à vontade para arriscar”, afirma.
Para as empresas, o turnover elevado resulta em prejuízos financeiros, já que as indenizações trabalhistas são altas. Além disso, as organizações precisam investir constantemente em capacitações para tentar fidelizar os funcionários interessados em permanecer no emprego. Na opinião de Fernando Moraes, oferecer um aumento salarial não é uma alternativa viável. “O varejo está trabalhando com margens apertadas e os salários oferecidos geralmente são compatíveis com o mercado. A melhor saída é a capacitação.”
Para Filomena Mineto, consultora da ACIL que ministra capacitações na área de gestão de pessoas, o investimento no capital intelectual das empresas é um caminho sem volta e não deve ser encarado como ‘custo’. Um dos pilares da retenção de pessoal é o comprometimento da empresa com o colaborador, que passa pela capacitação. “Onde está o custo maior? Nos pagamentos das demissões e admissões ou na capacitação dos colaboradores? Além disso, a capacitação é uma forma de reconhecimento, está ligada com o fator emocional, com o olhar para o ser humano. E essa valorização do quadro de funcionários pode diminuir o turnover”, avalia a consultora.
Segundo ela, nos últimos anos, as organizações estão mais atentas e preocupadas em relação à capacitação profissional dos seus colaboradores, principalmente com o grupo de gestores. “Mas ainda precisamos sensibilizar um número maior de empresas que façam esse investimento no seu capital humano/intelectual para que os seus resultados sejam mais eficazes”, ressalta Filomena Mineto.
Nova geração, novo comportamento
Filomena Mineto alerta que a nova geração que está entrando no mercado é mais exigente, em comparação aos funcionários que já passaram dos 30 anos. “Os colaboradores da geração anterior criavam um vínculo com a empresa e trabalhavam por lealdade. Já a nova geração é movida por desafios e tem valores diferentes”, salienta. Ela acrescenta que também é importante perceber que todas as gerações possuem pontos negativos e positivos. “A vantagem da nova geração é que eles são rápidos, criativos e tem uma flexibilidade maior. Em contrapartida, exigem mais do empregador. Querem crescer e priorizam as empresas que possuem um plano de carreira definido.”
Outra questão que está relacionada com a rotatividade é a falta de preparo das lideranças. As empresas devem investir em programas de liderança, de longa duração, para conseguir desenvolver os conceitos adquiridos e promover as mudanças necessárias. “Os líderes precisam aprender a lidar com a nova geração que está entrando no mercado. Esse é o grande desafio das empresas: investir nas pessoas para reter os talentos”, enfatiza Filomena Mineto.
Lição de casa
O setor supermercadista está entre aqueles que apresentam maior turnover. De acordo com a pesquisa mais recente realizada pela Associação Paranaense de Supermercados (APRAS), o índice de rotatividade chega a 94% ano. O estudo demonstra ainda que o desligamento é maior entre os colaboradores com menos de 30 anos e que a principal motivação não é o salário, mas sim a falta de liderança e comunicação. Outros fatores como a falta de assessoria e benefícios – um local adequado para tomar um café, por exemplo –, e os horário exigidos pelo setor, como trabalhar em finais de semana e feriados, foram apontados como principais causas dos desligamentos, antes da questão financeira.
Para Andréa Luy, gerente da Academia Empresarial da APRAS, o cenário pode mudar se as empresas supermercadistas tiverem no comando um bom gestor de pessoas. “A capacitação das lideranças, principalmente dos líderes de lojas, contribui com a retenção dos colaboradores”, analisa.
A rede de supermercados Super Muffato está seguindo a receita passo a passo para diminuir a evasão de mão-de-obra e investe num programa de treinamento contínuo de líder coach. “Praticamente 80% dos funcionários já têm acesso à cultura coach, que está se multiplicando dentro da empresa. Além de treinar os líderes de lojas, capacitamos os encarregados, mais de 700 em toda a rede, que exercem a liderança intermediária”, diz Dari Antonio de Mello Paz, diretor de Recursos Humanos do Grupo Muffato.
Ele argumenta que o papel do líder é acompanhar a equipe. Nesse sentido, a cultura coach ensina a “sentir” e a “ouvir” o ambiente para fornecer feedbacks positivos, capazes de dar um norte com um significado claro para os colaboradores. “A equipe precisa saber que está sendo valorizada e que pode crescer dentro da empresa, principalmente entre o público jovem, que passa pela experiência do primeiro emprego. Essa geração, em especial, exige transparência e verdade na relação com o líder”, frisa Dari Paz.
Na Universidade Corporativa do grupo, a Uniffato, os funcionários têm a oportunidade de galgar cargos mais altos, em diversos setores. Cerca de 70% dos gerentes, por exemplo, são formados dentro da corporação. O treinamento dura 18 meses e combina formação acadêmica e conhecimento prático adquirido dentro da própria empresa. Nas ocasiões de inauguração de novas lojas a prioridade é olhar para os talentos que já estão na corporação. Muitas vezes eles mudam o endereço do trabalho e são transferidos para outra loja da rede para ficar mais perto de casa e ainda são capacitados e promovidos para exercer uma nova função.
A valorização dos colaboradores também passa por uma política forte de endomarketing. No dia do aniversário todos os funcionários ganham um presente. Além disso, aqueles que são eleitos “funcionários do mês” são agraciados com um jantar, com direito a acompanhante, para celebrar os bons resultados. As melhoras ideias, aquelas que podem contribuir com melhorias de processos e serviços dentro da organização, também são premiadas. “A gestão de pessoas é um movimento gradativo e está focada no respeito e no bom relacionamento na rede Muffato. Trabalhamos para descontruir os pontos negativos e construir valores positivos. Sabemos que há muito ainda para ser feito, mas já estamos alcançando bons resultados. Nos últimos dois anos nós reduzimos em 24% a rotatividade anual”, comemora Dari Paz.