Ao contrário da cidade de São Paulo, que tem uma disponibilidade hídrica ruim, os principais centros urbanos do Paraná são bem abastecidos. Enquanto na capital paulista a oferta anual de água por habitante é de 300 metros cúbicos, equivalente a Israel e abaixo do limite de escassez hídrica estipulado pela Organização das Nações Unidas (ONU), que é de 500 metros cúbicos por habitante por ano, na região de Londrina a disponibilidade chega a quase 4 mil metros cúbicos. Isto significa que o mesmo volume de água ofertado para cada londrinense é 13 vezes maior que para cada paulistano. O Rio Tibagi é o grande reservatório natural responsável por este índice. Já em Curitiba e Região Metropolitana, a marca fica nos 500 metros cúbicos.
Especialistas apontam que as cidades do Paraná, de maneira geral, têm situação mais confortável que a vivida hoje na Grande São Paulo, mas alertam para a necessidade de investimentos constantes e conscientização por parte da população. "Não podemos esquecer que nossa população não para de crescer e que a água que consumimos vem basicamente de mananciais superficiais, mais sujeitos à degradação resultante da ocupação urbana desordenada. Se perdermos a qualidade da água destes rios, teremos que captar cada vez mais longe, que é o que já vem acontecendo com São Paulo", aponta o professor do Departamento de Hidráulica e Saneamento da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Miguel Mansur Aisse.
Para planejar as necessidades da região no futuro, a Sanepar está iniciando o Plano Diretor de Recursos Hídricos – Anel Norte, que deve ficar pronto em três anos e contempla 265 municípios, dos 345 atendidos pela companhia no Estado. O estudo deve apontar de onde a água será captada nos próximos 50 anos e onde serão lançados os efluentes.
Uma necessidade já apontada pelo estudo, de acordo com o gerente geral da Sanepar para a região Norte, Carlos Roberto Pinto, é a necessidade de levar água do Rio Tibagi para mais municípios, por meio de um sistema integrado (que atualmente só está presente nas maiores cidades). Hoje o manancial é responsável por 55% do sistema Londrina/Cambé, e pela água que abastece as populações de Telêmaco Borba e do município homônimo de Tibagi. "É um rio que tem condições de abastecer um número maior de municípios, mas estamos estudando o que é viável técnica e economicamente", explica o gerente. Um dos municípios que em um futuro próximo devem passar a depender do Tibagi está Ponta Grossa.
Para Carlos Pinto, o Paraná tem poucas chances de viver situação semelhante à de São Paulo. "Só se tivéssemos algo totalmente fora das médias históricas de chuva ou um evento muito fora do comum", afirma. Segundo ele, o racionamento enfrentado no início deste ano por municípios do Norte Pioneiro, como Ibaiti, Andirá, Santana do Itararé e Wenceslau Braz foi causado por queda na vazão de rios e poços que abastecem a região, em função da estiagem, somada ao aumento de consumo de água nos dias de forte calor do último verão.
De lá para cá, algumas obras teriam sido feitas para aumentar a capacidade de captação. "Não podemos dizer que não haverá mais problemas, mas estamos melhor preparados. Há momentos críticos, que podem gerar problemas pontuais. Mas é importante ressaltar que não são problemas crônicos", argumenta a gerente de projetos da companhia, Marisa Capriglioni. Atualmente a Sanepar opera mais de 600 sistemas de captação, e a tendência é que sejam cada vez mais interligados, como já acontece com Londrina e Cambé e na Região Metropolitana de Curitiba.
O estudo que começa a ser realizado pela Sanepar ainda não aponta projeções de quanto deve aumentar o consumo de água no Estado nas próximas décadas, mas para o professor da UFPR o desconhecimento da realidade nos próximos anos é mais um motivo para não descuidar. "Hoje a RML é relativamente bem atendida, com vários reservatórios capazes de suprir as estações com menos oferta de água. Mas os investimentos não podem parar, porque nossas cidades crescem muito e não sabemos qual será a situação daqui a cinco anos", exemplifica Miguel Aisse.
Projeto suspenso
Segundo dados da Sanepar, 80% da água utilizada no Estado é captada em mananciais superficiais (rios e lagos) e 20% de poços. Isto, para o professor, indica a importância de manter a qualidade das águas. "Se a perdermos, o custo para a população será cada vez maior", diz ele, chamando a atenção para os riscos oferecidos por iniciativas como o Projeto de Lei nº 721/2013, de autoria do Executivo estadual, que libera a construção de empreendimentos em áreas próximas a reservatórios e corpos d’água, hoje consideradas de preservação, sob o argumento de que a atual lei é muito restritiva. No início de maio, após pressão do Ministério Público e de entidades ligadas ao meio ambiente, o governo decidiu suspender a tramitação do projeto e reavaliar o texto.
De acordo com Aisse, os mananciais subterrâneos são pouco utilizados no Brasil em função dos altos custos de perfuração. "O Aquífero Guarani, por exemplo, tem grande profundidade, não há competitividade em relação aos rios." Na região de Londrina, o Tibagi é responsável pelo abastecimento de 55% da população, enquanto o Ribeirão Cafezal responde por 37% e os poços (Guarani e Serra Geral), por 8%.