Fonte: Folha de Londrina
Na visão da moradora Renata Suzue Ogata, de 33 anos, ''a Sergipe é uma rua divertida, com comércio acessível e popular. Além disso, ela carrega muitas histórias, já que os primeiros imigrantes abriram seus negócios aqui'', diz a pedagoga. Mas até mesmo para aqueles não moram na via o local é ''digno de ser frequentado. Tem muita loja e de todos os tipos. Tem relojoaria, ótica e lanchonetes'', comenta a dona de casa Gesilene dos Santos, enquanto passeava com a filha Laura.
São olhares como estes, além de tantas histórias, que fazem da Rua Sergipe um ponto de encontro dos londrinenses e de quem está apenas de passagem. É por esse motivo que o local ganhou mais de 100 páginas, compondo o livro ''Rua Sergipe: Patrimônio Cultural Londrinense'', com lançamento para o dia 31 de agosto, às 20 horas, no Museu de Arte de Londrina.
Organizado pelo professor das áreas de História e Sociologia do Centro Universitário Filadélfia (Unifil), Leandro Henrique Magalhães, o livro é patrocinado pelo Programa Municipal de Incentivo à Cultura (Promic) e faz parte do Projeto Educação Patrimonial, proposto pelo Instituto de Desenvolvimento Social de Pesquisa e Ensino (Indespe). A autoria é de professores e estudantes vinculados ao Unifil e Inventário e Proteção do Acervo Cultural de Londrina (Ipac/UEL).
Segundo Magalhães, o objetivo é produzir materiais para que todos tenham um olhar diferente para o local, que é um patrimônio cultural da cidade. ''Além do livro, que passou a ser desenvolvido em 2010, foram criadas várias ações junto à comunidade desde 2005, como passeios e materiais escolares, pois entendemos que a Sergipe é um bem cultural da população londrinense. É um local de comércio consolidado e que está no imaginário das pessoas'', explica.
Enfoques
Em 104 páginas, o livro traz três enfoques principais, sendo o arquitetônico, histórico e antropológico. No primeiro quesito, há que se destacar a arquitetura art déco, que se fez presente a partir de 1939, principalmente quando um decreto municipal proibiu a construção de casas de madeira nas principais vias da cidade e permitia apenas as de alvenaria. Atualmente, são raras as construções que ainda preservam o estilo.
Essa mudança ocorreu quase uma década após o surgimento da Rua Sergipe e a instalação dos principais comércios. Em um trecho do livro, há a descrição da predominância da colônia libanesa e, principalmente, japonesa, que predominava com bazar, secos e molhados, mercados e relojoarias. ''No contexto histórico, é curioso saber que a Sergipe já foi chamada de 'Pequena Tóquio', justamente pelos comerciantes orientais. Inclusive, o primeiro arranha-céu de Londrina foi construído ali, como Edifício Tókio'', revela Magalhães.
Movimento
Ao transitar pela via hoje é possível perceber as mudanças que ela sofreu e vem sofrendo ao longo dos anos. Atualmente, a Sergipe está sendo ampliada e com a Lei Cidade Limpa o visual também mudou através da padronização das fachadas. Porém, alguns balcões ainda reservam a tradição. Como na Relojoaria Venus, administrada hoje por Keidi Hasuda. ''Meu pai abriu a loja em 1962 e eu cresci aqui. Lembro que tinha um fluxo muito grande de pessoas por causa da Rodoviária (atual Museu de Arte)'', conta.
A família atendia muitos lavradores, que aproveitavam a ida à Sergipe para também comprar tecidos, fumo, cereais ou simplesmente passear, aproveitando os bares e pastelaria, como a de Jorge Sekiyama, proprietário da Pastelaria e Vitamina Sergipe, presente há 40 anos, na esquina da Rua Mato Grosso.
''Meus pais são imigrantes e vieram trabalhar na lavoura. Com o tempo, compraram esse espaço e estamos até hoje. Já recebi várias propostas, mas não vou me mudar. É uma rua histórica e não me incomodo com o barulho e nem o movimento de carros e ônibus. Já me acostumei'', diz ele, ao comemorar a notícia sobre o livro. ''Acho muito bom, pois assim, essa rua será ainda mais lembrada, não importa o tempo''.
Agito
Assim como os comerciantes, os poucos moradores que ainda vivem na Sergipe também se acostumaram com o volume de pedestres e veículos. Porém, dona Deolinda Ricanelli, de 91 anos, suspira de saudades ao lembrar que um dia a rua já foi um lugar tranquilo, onde os vizinhos colocavam cadeiras em frente de casa e papeavam por longas horas. ''Nós mudamos de Lins, no interior de São Paulo para cá, em 1935. Meu pai veio trabalhar como pedreiro e construiu essa casa com a ajuda do meu irmão'', conta a descendente de italianos.
Hoje, dona Deolinda aproveita a calmaria de sua varanda, que fica a poucos metros da calçada, mas confessa que não resiste em relembrar os bons tempos em que saía para passear no centro. ''A rua está muito diferente, cheia de movimento, mas de vez em quando eu dou uma saidinha. É só tirar o pé do quintal, que já estou no meio do agito. É muito bom''.
Serviço – O lançamento do livro será no dia 31 de agosto, às 20h, no Museu de Arte de Londrina. Os exemplares serão distribuídos para escolas, bibliotecas e quem se interessar, poderá fazer o download gratuito pelo site www.unifil.br